Conversando sobre educação científica

Aqui nós, do Núcleo de Educação Científica - NECBio, da UnB, criamos um espaço para a troca de idéias sobre educação científica, divulgação da ciência e debates sobre o papel da ciência em nossas vidas. Esperamos que sirva de mapa para a rica mina da divulgação científica e para recursos voltados para ensino de ciências e biologia. Aproveite!


terça-feira, 6 de julho de 2010

Por que é importante conservar a biodiversidade ?

Há vários bons motivos para conservar a biodiversidade. Uma parte desses motivos tem relação com a própria existência da biodiversidade e outros estão relacionados com a sobrevivência da nossa espécie e em que condições tal sobrevivência se dá. Dentre as razões relacionadas com a própria diversidade biológica, estão aquelas de cunho ético e até mesmo as estéticas. Muitas vezes, esse conjunto de razões é questionado e, de fato, é difícil responder objetivamente à questão: a biodiversidade tem um valor intrínseco? Por outro lado, os motivos relacionados com o uso da biodiversidade e sua utilidade para humanidade encontram ecos mais facilmente. Um exemplo, cada vez mais explorado, é o dos serviços ambientais. E para ilustrar, nada melhor que uma pequena viagem... para a Lua!

Imagine que você quisesse realmente ir para a Lua e lá se estabelecer? Do que precisaria? Vamos supor, para ficar mais simples, que a atmosfera e o clima da Lua fossem similares aos da Terra. Você, depois de fazer as malas, teria que escolher, então, que espécies, dentre as milhares existentes na Terra, levar consigo. Bom, um critério aceitável é começar pelas espécies que podem ser diretamente exploradas e fornecem alimentos, fibras, madeira, remédios e outros produtos como óleos, resinas e borracha. Essas já são numerosas... afinal você não pretende comer apenas batatas na Lua...

Mas... se você pensar um pouco, verá que precisa levar outras espécies para garantir a sobrevivência dessas que você escolheu. Que espécies são essas e quantas são? Não se sabe... Ou seja, ninguém sabe ao certo quais são e quantas espécies são necessárias para sustentar a vida humana na Terra.

Quem sabe uma outra abordagem... enumerar os serviços ambientais que você vai precisar na Lua. Vejamos: purificação da água e do ar, moderação de eventos climáticos extremos, proteção contra os raios ultra-violetas, decomposição do lixo, geração e manutenção da fertilidade do solo, polinização das espécies, dispersão de sementes e controle de pragas e doenças. Pelo menos esses. Quais e quantas espécies espécies seriam, pois, necessárias para garantir esses serviços? Tomemos, como exemplo, o caso da fertilização do solo: de quantas espécies precisamos para assegurar esse serviço? Em um grama de solo, encontramos cerca de 30 mil protozoários, 50 mil algas, 400 mil fungos e bilhões de bactérias. Em uma escala mais ampliada, para além de um grama, encontraremos também as minhocas e os insetos... (Daily, 1997).

Nessa altura do campeonato, se você já desistiu de ir para a Lua e resolveu ficar por aqui, vai ter que lidar com uma outra questão, também correlacionada a conservação da biodiversidade: a crescente exclusão social. Se considerarmos os serviços ambientais, como a purificação da água e do ar, a mitigação de secas e de enchentes, a desintoxicação e decomposição de resíduos, a geração e renovação do solo e de sua fertilidade, a polinização, o controle da vasta maioria das doenças e pestes potenciais, a dispersão de sementes e translocação de nutrientes, a fonte potencial de recursos agrícolas, farmacêuticos e de novos materiais, moderação de temperaturas extremas, entre outros, perceberemos que seu comprometimento encareceria os produtos deles derivados, fazendo com que muitas pessoas não pudessem continuar a ter acesso a eles. O caso da qualidade da água, descrito acima, é apenas um exemplo: a perda de qualidade da água no local de captação, encarece o tratamento, o serviço de abastecimento tem seus preços aumentados e para muitos, torna-se impossível pagar. Em resumo, o comprometimento dos serviços ecológicos, principalmente em países como o nosso, resulta em aumento da exclusão social e econômica de uma parcela maior da população.

Uma alternativa à conservação da biodiversidade sempre apontada é a substituição de suas funções úteis para a humanidade por alternativas tecnológicas. Não há dúvida que a tecnologia resolveu muitos dos problemas ambientais e apresenta um enorme potencial para solucionar muitos outros, principalmente com a emergência da biotecnologia e da nanotecnologia. A tecnologia, porém, apresenta uma outra faceta que não pode deixar de ser considerada: seu desenvolvimento recente está concentrado em algumas partes do mundo e nas mãos de algumas poucas grandes corporações e dificilmente seus produtos serão acessíveis a toda população humana. A consequência mais direta desse cenário é que a tecnologia criará um grupo de privilegiados com acesso a seus produtos e serviços, muitas vezes substitutos dos naturais destruidos por nós. O irônico é que a destruição dos produtos e serviços naturais, em geral, se deve aos padrões de consumo desse mesmo grupo de privilegiados que terá acesso aos resultados do desenvolvimento tecnológico.
"Texto de Nurit Bensusan, bióloga que divide seu tempo trabalhando com conservação da biodiversidade e refletindo sobre meio ambiente, ciência e tecnologia no blog "Nosso Planeta".
Bibliografia
Daily, G.C. 1997. Nature´s services: Societal dependence on natural environments. Island Press, Washington.

Textos para download

Serviços ecológicos - Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por quê. Nurit Bensusan, 2008.

Links interessantes

Biodiversity Conservation Network
Scientific Definitions of Biodiversity
União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN)
O valor da biodiversidade, por Paulo Coutinho

Livros interessantes

Maclaurin, J. & K. Sterelny. 2008. What is biodiversity? The University of Chicago Press, Chicago.

Daily, G.C. 1997. Nature´s services: Societal dependence on natural environments. Island Press, Washington, DC.

Baskin, Yvonne.1997. The work of nature: How the diversity of life sustains us. Island Press, Washington, DC.

Buchmann S.L e G. P. Nabhan. 1996. The forgotten pollinators. Island Press, Washington, DC.

Bensusan, N. (org). 2008. Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por quê. 2a. edição (revisada e ampliada). Editora Universidade de Brasília, Brasília; Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB, Brasília e Editora Peirópolis, São Paulo.

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